Centro de Tradições Gáucha de Uberaba - MG
Cultura Nativa
Poesia: Taperas da Alma
Habitação esquecida
Por famílias andejantes
Que por irem mais adiante
Em busca de melhores dias
Olvidaram nas cercanias
Do rancho apodrecido
Sinais de um tempo perdido
que o brilho dos olhos alumia.
É que a casa que nos cria,
Ainda que a abandonemos,
Nos mostra de onde viemos,
Como se nos desse uma lição:
Para que, na arca do coração,
Levemos nossa origem
E os sentimentos que aflijem
Os que amam o seu chão.
É por isso que, contrariado,
Vez por outra, ali eu passo...
E a sensação de um fracasso
Me corrói pelas entranhas
Pois também, Eu, na campanha,
Deixei um rancho tapera
Vertente de minhas quimeras
E, então, minh´alma se arranha.
É que, nas paredes em ruínas
Arquejadas pelo tempo
Sinto o calor do vento
Que esvoaçava a melena
De uma criança pequena
Sentada no colo do pai
De cuja boca se extrai
Somente o que vale a pena.
E dos cinamomos antigos
Que, no inverno, perdem folhas
Vejo que nossas escolhas
É o que forja nosso destino
Pois aquele simples menino
Que um dia abandonou seus pais
Também deixou para trás
Seus anseios e desatinos.
De modo que hoje, vendo,
As janelas carcomidas
Pelo tempo que, nossa vida,
Também, aos poucos, consome
Concluo que, quando o homem,
Deixa suas raízes ao relento
Não pode se queixar se o vento
Faça perder-se seu nome.
Que tristeza ver, então,
Que a casa virou tapera
Já não é mais o que era:
Estão caídas suas paredes;
E o poço, não mais mata a sede
Dos que hoje são andantes,
E, pior, o balde de antes,
Coberto pelo zinabre verde.
Na mangueira, hoje vazia,
Só se ouve o berro do silêncio
E os gritos de Zézinho ou Juvêncio
Já não se escutam mais
Somente a coruja com seus ´ais´
Dá um ar alvo aos palanques
Onde o cerne ainda garante
Um resto de vida nos currais.
Os corredores, porém,
Já não têm marcas de casco
E, no fogo onde havia churrasco,
As labaredas se apagaram
Mas, negros tições ficaram
Como testemunhas silentes
Mostrando para minha gente
Que as taperas nos forjaram.
Espero, pois, que meus filhos,
Não façam o que um dia Eu fiz:
Não Esqueçam, por favor, a raiz,
Donde brotam as mais belas flores
Que, do sumo, produzem licores
Que ao paladar acalanta
E que, no peito, agiganta
Os mais sinceros amores.
É que a vida tem um trajeto
De início, meio e fim
E isso, ao que parece, prá mim,
Me passou despercebido
Pois no ´caminho´ foi esquecido
O que de mais importante há:
´Não podemos deslembrar
Daquilo que faz sentido´.
Ainda bem, que, de tudo isso
Consigo reconhecer meu erro
E ao ver a tapera, no cerro
Sinto que algo marcou
Pois igual a um leito que secou
Há vertente, ainda que um fio;
dizendo que, se o corpo da tapera caiu,
ao menos a alma, em mim, ficou.
Autor: Waldemar Menchik Júnior
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